Lula e Rosemary: silêncio cada vez
mais revelador
Nos oito anos que passou no Palácio
do Planalto, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva sempre teve como
característica o hábito de falar constantemente e sobre tudo. Em tempos de
crise, chegou a ser aconselhado por assessores diretos e marqueteiros a manter
relativa distância dos microfones. Mas, quase nunca, a recomendação foi
seguida. É quase unânime a avaliação de aliados que convivem com Lula há
décadas que o silêncio nunca lhe agradou, ainda que o tema seja dos mais
espinhosos, como o mensalão, que quase lhe custou o mandato. Porém, há cinco meses, um assunto é proibido ao redor do ex-presidente:
Rosemary Noronha.
A edição de VEJA desta semana detalha
a atuação de
Rosemary, ou Rose, como era conhecida, nas
entranhas do poder. A mulher que chefiava o escritório da Presidência da
República em São Paulo e acompanhava Lula em viagens internacionais usava a
proximidade com o petista para negociar favores.
Na época do estouro da Operação Porto Seguro, a Polícia Federal desmontou uma quadrilha que
traficava influência nos altos escalões do governo federal. Paulo Vieira,
ex-diretor da Agência Nacional de Águas (ANA), comandava o grupo.
Rosemary Noronha deve a Lula sua
ascensão no poder público. Intimamente ligada ao petista, ela tinha privilégios
e integrou, diversas vezes, comitivas presidenciais no exterior. Apesar da
grande expectativa a respeito do que o petista teria a dizer sobre o episódio,
Lula silenciou desde a operação Porto Seguro, deflagrada em 23 de novembro.
Foram 27 pronunciamentos, entre discursos e entrevistas. Mas, em 148 dias, nada
explicou sobre as graves acusações envolvendo a mulher que era sua amiga íntima
e que foi indicada por ele para chefiar o escritório da Presidência em São
Paulo.
Nesse período, Lula deu ordens a
secretários do prefeito paulistano Fernando Haddad (PT), despachou com
ministros do governo Dilma Rousseff, recebeu prêmios, deu palestras, se reuniu
com líderes mundiais, prestou consultoria a empresas brasileiras. Sobre Rose,
uma frase discreta, a contragosto, quando questionado se tinha sido
surpreendido pelas revelações da Polícia Federal: "Não fiquei surpreso,
não".
Lula avalia que não tem nada a ganhar
comentando o episódio. Ele afirma, reservadamente, que o silêncio evita que o
caso seja associado a ele e contribui para que o escândalo perca força no
noticiário.
A postura revela o quanto o
ex-presidente se sente desconfortável com a revelação de que a antessala do
poder era usada para negociações escusas. Mesmo titubeante, Lula não evitou
tecer comentários sobre outros escândalos, como o mensalão, o dossiê dos
aloprados ou a morte do prefeito Celso Daniel, um fantasma que assombra o PT.
Mas, a cada nova revelação sobre as andanças de Rose, pode se supor o que Lula
tanto teme.(Veja/Reuters)