Voto de protesto
O ESTADO DE
S.PAULO
01 Outubro 2014
Na segunda-feira, primeiro dia útil
depois da divulgação da pesquisa do Datafolha, que não apenas consignava que a
presidente Dilma Rousseff abriu vantagem de 13 pontos sobre a rival Marina
Silva, mas trazia de volta a hipótese de reeleição da petista já no primeiro
turno, o Ibovespa caiu 4,52%, o maior tombo em um único pregão dos últimos três
anos, e o dólar fechou a R$ 2,451, a mais alta cotação desde dezembro de 2008,
no auge da crise internacional. Trata-se de uma reação impressionante pela
intensidade e racional pelo que a motivou. É um enfático voto de protesto da
comunidade econômica, depositado na urna dos mercados financeiros, diante da
perspectiva, agora mais nítida, de que os próximos quatro anos podem ser um
replay destes que estão para terminar.
O cenário de mais do mesmo não
resulta, como quer fazer crer a presidente, de um patológico pessimismo dos
agentes econômicos nem tampouco denota uma inclinação perversa pelo quanto
pior, melhor - o jogo jogado pelo PT nos anos 1990 quando o País do Plano Real
mudava, aí sim, para melhor. O pessimismo com o sombrio quadro presente e com o
que muito provavelmente está por vir deriva de fatos insuscetíveis de
controvérsia: a coleção de desastres de um governo que, desde o seu advento,
carrega a duvidosa distinção de não ter feito outra coisa a não ser meter os
pés pelas mãos. E que maliciosamente transfere para a retração do nível de
atividade das grandes potências econômicas a responsabilidade pelo atolamento
da economia nacional. Como se o mundo exterior - e não ela própria, com a sua
combinação tóxica de soberba e incompetência - a tivesse conduzido ao charco.
Olhem-se pelo ângulo que se queira os
resultados da "política econômica" dilmista e o que se enxerga é um
país despencando ribanceira abaixo. Praticamente a cada dia pioram os
prognósticos - entre os quais do próprio Ministério do Planejamento - sobre os
números do PIB deste ano. O mais recente deles, do Banco Central (BC), rebaixou
de 1,6% para 0,7% a taxa de expansão da economia em 2014. Trata-se de um
desempenho de envergonhar, mesmo perante os nossos vizinhos. E não periga
melhorar, dado outro indicador alarmante: a taxa de investimento em bens de
capital e obras de infraestrutura deverá encolher 6,5% até dezembro. E o que
dizer da indústria sucateada, com um retrocesso previsto de 1,6% em comparação
com 2013? Já a inflação anual, na melhor das hipóteses, ficará em 6,3% - ou 1,8
ponto porcentual acima do centro da meta, que já é alto.
Não venha o governo jogar areia nos
olhos do público, gabando-se do que seria o pleno-emprego obtido graças à
clarividência da presidente. Os números oficiais escamoteiam que, nos últimos
tempos, a taxa de ocupação não aumentou, mas, sim, o contingente de brasileiros
que deixaram de procurar trabalho, excluindo-se da população economicamente
ativa e, portanto, das estatísticas. Além disso, com as contratações se
concentrando no setor público e no de serviços, cresce a proporção de empregos
de baixa qualidade: os de alta qualidade sumiram porque o seu provedor natural,
a indústria, se tornou um morto-vivo. Nenhum agente econômico que se preze pode
ignorar essa realidade - e o seu prolongamento por mais quatro anos se as urnas
confirmarem as últimas pesquisas. Quem se encarrega de fundamentar as piores
previsões é a presidente em pessoa.
Diante do desmazelo das finanças
públicas, por obra da gastança erigida em política de Estado, Dilma deixa
explícito que dela não se espere, no segundo mandato, o choque fiscal imprescindível
para resgatar a economia do buraco. Nesse ponto, uma comparação se impõe: em
2002, quando o favoritismo de Lula nas sondagens levava o dólar à estratosfera,
bons conselheiros o induziram a acalmar os agentes econômicos garantindo numa
Carta aos Brasileiros que o seu governo não faria aventuras. Lula tinha a seu
lado interlocutores capazes como Antonio Palocci e Henrique Meirelles. Mas a
interlocução só foi possível porque Lula era pragmático. Já Dilma é ideológica
e onisciente. Diante disso, ninguém vê na anunciada demissão do titular da
Fazenda, Guido Mantega, um sinal de mudança. O comportamento do mercado
comprova o ceticismo.