O jornalista David Coimbra, em sua cronica diária na ZH, fala de maneira clara sobre o que classifica de o fim do PT. Publico para que quem não teve a oportunidade de ler mo jornal, não perca.
O PT acabou
David
Coimbra*
A estratégia
do PT para se defender das denúncias de corrupção que apodreceram o partido pode criar
precedente jurídico. Os petistas não negam que tenha havido roubo nos governos Dilma e Lula. Não. Eles se contentam em
provar que houve roubo também no governo Fernando Henrique. Já estou vendo os
advogados do país se valendo da jurisprudência:
— É verdade,
meritíssimo, o meu cliente é traficante de drogas. Mas o Elias Maluco também é!
— Sim,
senhores do júri, o meu cliente matou, mas 92% dos assassinatos no Brasil não
são resolvidos. Por que querem resolver justamente este? A quem interessa
condenar o meu cliente?
Compreensível
o esforço dos petistas. O PT surgiu como uma bela ideia de que seria possível
fazer política ética. Lembro de uma entrevista do Cazuza para o Jô Soares no
final dos anos 80, em que ele falava com simpatia da "pureza" dos
petistas, que não aceitavam negociatas. Tal era o espírito do PT, ao ser
fundado num fevereiro como este, 35 anos atrás. Era essa pureza.
O PT ganhou
o poder e perdeu a pureza. "De que adianta ganhar o mundo inteiro, se você
perder a própria alma?", escreveu Marcos, citando Jesus. O PT perdeu a
própria alma. Seria melhor não ter conquistado a Presidência, melhor não ganhar
o mundo inteiro. Ainda teríamos a ilusão da ideia fundadora do PT: de que fazer
política decente é possível.
Quando o PT
se apresenta como um novo Adhemar de Barros, um rouba mas faz do século 21,
quando o PT se apresenta como um Robin Hood caboclo, que tira dos ricos para dar
aos pobres, quando o PT se justifica argumentando que rouba porque todos
roubam, só torna tudo mais triste e sombrio. Porque parece não ser possível.
Antes os
petistas dignos reconhecessem que as coisas deram errado, que não saíram como
eles queriam, e tentassem de novo, de outra forma, não mais pelo PT. Porque o
PT acabou. O PT tomou o rumo de outras legendas históricas do Brasil. O velho
PCB de Prestes se liquefez com as contradições da União Soviética, o PTB de
Brizola hoje é um balcão de fisiologismos, o MDB de Simon virou uma geleia
disforme, o PDS se orgulhava de ser "o maior partido do Ocidente",
mas era sucedâneo da Arena e hoje não existe mais nem como sigla, o PSDB surgiu
como um seguidor da moderna social-democracia européia e se mostrou um servidor
da plutocracia paulista, e o PFL... Bem, o PFL sempre foi o PFL.
Hoje, o
Brasil não precisa da ladainha supostamente ideológica dos defensores do
governo. Ninguém mais acredita nessa conversa de que há uma luta entre os
representantes das elites versus os representantes dos pobres. Todos sabemos
que só há uma luta, no Brasil: a luta pelo poder.
Hoje, o
Brasil não precisa de um bom governo, não precisa nem de um governo competente.
Só precisa de um governo honesto. Porque o brasileiro não é um povo de corruptos,
como querem fazer crer os interessados na relativização da roubalheira.
Corrupto é o governo do PT. Corruptos foram governos passados. Porém, há
petistas honestos. Há muita gente dos outros governos que é honesta. A maioria
das pessoas que conheço é honesta. O povo brasileiro é tão honesto quanto
qualquer povo do mundo.
O PT errou.
Muitos outros erraram. Mas a indignação do brasileiro com esses erros já basta
para mostrar que isso se tornou intolerável. Que nós iremos em frente. Que é
possível. Sim, é possível.
*Publicado na ZH de hoje, dia 11/02/15