O governo Dilma
está com jeito de que chegou ao fim
Ricardo Noblat
06/08/2015
O governo balança, balança, e pode não chegar ao fim do ano. Só ganhará uma sobrevida com a ajuda da oposição.
Em síntese, foi isso o que disse, sem
disfarçar a apreensão, o vice-presidente da República e coordenador político do
governo Michel Temer (PMDB-SP).
Depois de um dia de reuniões com
representantes de todos os partidos que supostamente apoiam o governo, e ministros
chamados às pressas por ele,
Temer procurou os jornalistas e
ditou:
- A declaração que eu quero fazer é
aos vários setores da sociedade.
Particularmente aos partidos políticos, aos
companheiros do Congresso. (...) Nós
estamos pleiteando exata e precisamente
que todos se dediquem a resolver o problema do país. Não vamos ignorar que a
situação é razoavelmente grave.
Não tenho dúvida de que é grave. É
grave porque há uma crise política se ensaiando, há uma crise econômica que
precisa ser ajustada. Faço este apelo.
- Vocês sabem que ao longo do tempo
tivemos sucesso na articulação política. Mas hoje, quando se inaugura o segundo
semestre, agrava-se uma possível
crise. Precisamos evitar isso. Em
nome do Brasil, do empresariado, dos trabalhadores, é preciso que alguém possa,
tenha capacidade de reunificar a todos, de unir a todos, de fazer esse apelo.
Tomo a liberdade de fazer esse pedido porque, caso contrário, poderemos entrar
numa crise desagradável. É preciso pensar no país acima dos partidos,
acima do governo.
O que deu em Temer? Em Temer, não, no
governo? Porque ele falou pelo governo. Teve o cuidado, antes de falar, de
trocar ideias a respeito com a
presidente Dilma. Ela o autorizou a
falar.
Deu que Temer jogou a toalha como
coordenador político do governo. Deu-se conta que não funcionará a política de
distribuir cargos e sinecuras em troca
de votos no Congresso.
É a única política que o governo
imaginou dispor para manter unida sua base de sustentação. Base tão ampla era
uma miragem. Sempre foi desde a
reabertura do Congresso em fevereiro
último.
Esfarelou-se. E por uma razão que
costuma explicar o abandono de governos por aliados de ocasião: a
impopularidade dos governos. Políticos e partidos
são sensíveis ao ronco das ruas.
A aprovação do governo só faz cair.
Era de 7,7% na mais recente pesquisa CNI/MDA. Números frescos à disposição do
governo mostram que o
percentual de aprovação caiu mais.
Pesquisa aplicada na semana passada
apenas na capital paulista pelo Instituto Paraná de Pesquisas registrou que a
desaprovação do governo Dilma bateu na
casa dos 90%.
Dito de outra maneira: 9 de cada 10
paulistanos rejeitam Dilma.
A declaração feita por Temer ganhou
cores de desespero quando ele disse a certa altura:
- (...) é preciso que alguém possa,
tenha capacidade de reunificar a todos, de unir a todos, de fazer esse apelo.
Que alguém é esse?
Num regime presidencialista, esse
alguém só poderia ser o presidente da República. Mas porque a presidente deixou
para Temer a tarefa de fazer o apelo?
Porque não tem mais condições de
fazê-lo. Perdeu a credibilidade. Perdeu a confiança dos seus governados. Perdeu
a autoridade política. Não se arrisca a
falar à Nação com medo de ser
hostilizada.
Se seu apego ao poder não fosse
demasiado, pediria as contas.
Talvez seja cruel afirmar que Temer,
ao dizer o que disse e da maneira como disse, ofereceu-se para ocupar um espaço
que está vago. Mas foi isso o que
aconteceu, mesmo contra sua vontade.
O vice-presidente no exercício
improvisado e ocasional da presidência foi secundado no seu apelo pelos dois
ministros mais importantes do governo –
Aloizio Mercadante, da Casa Civil, e
Joaquim Levy, da Fazenda. Sintomático.
Pela primeira vez, Levy arquivou seu
discurso geralmente cuidadoso para dizer que é grave a crise fiscal que o país
atravessa. Alertou para o risco do ajuste
não dar certo.
Mercadante admitiu que o governo
errou – sem apontar quando e como. Seria pedir demais a ele, convenhamos.
Para espanto da oposição, elogiou-a.
E por fim disse que somente um acordo suprapartidário será capaz de salvar o
país do pior.
Lula, Dilma e o PT sempre trataram a
oposição com desprezo. Há 12 anos que a espezinham. Agora pedem arrego. De
fato, é isso que pedem.
A resposta dos partidos a Temer, Levy
e Mercadante começou a ser dada pouco antes da meia noite de ontem mesmo.
PDT e PTB, que juntos têm 44
deputados federais e dois ministros de Estado, anunciaram seu rompimento com o
governo.
E a Câmara dos Deputados estava
pronta para aprovar novos projetos que poderão comprometer de vez o ajuste
fiscal.
Publicado no Globo.com