Infinita
capacidade de errar
Eliane
Cantanhêde
11 Setembro 2015
O rebaixamento da nota do Brasil pela
agência Standard & Poor’s é daquelas coisas que todo mundo e todo o mundo
já esperavam, mas, na hora que acontecem, viram um deus nos acuda. O mercado
reage, o Planalto finge que foi surpreendido e a oposição alardeia que “o
governo acabou”, como praticamente comemorou o senador Aécio Neves.
Entre esses polos, desenrola-se o
jogo puramente político, em que os atores decoram o script que lhes convém e
não o que combina melhor com os interesses do País. Acuada e impotente, a área
econômica registra o golpe dentro dos gabinetes e tenta providenciar explicações
e novas medidas diante dos microfones.
Numa reunião de emergência, a
presidente Dilma Rousseff subestimou (mais uma vez) o tamanho da encrenca: “Não
é catastrófico”. O ex-presidente Lula deu de ombros: “Não significa nada”. O
ministro Joaquim Levy tirou o corpo fora: “Foi uma avaliação política”.
Do outro lado, as ações da renúncia e
do impeachment dispararam na Bolsa política. O ex-ministro de FHC Luiz Carlos
Mendonça de Barros prevê uma “pressão insuportável” dos empresários e a
renúncia de Dilma. Os líderes do assanhadíssimo grupo suprapartidário
pró-impeachment já contabilizavam ontem à tarde 280 dos 347 votos necessários
na Câmara para afastar a presidente.
É ou não de tirar o fôlego? Dilma
parece empurrar seu governo ladeira abaixo, esforçando-se ao máximo para errar:
Orçamento de 2016 com rombo de bilhões de reais, o balão de ensaio da CPMF, a
tentativa de subir o IPI, o IOF e a Cide via decreto, Levy admitindo mexer no
Imposto de Renda. Com o controle da montanha-russa nas mãos, o PMDB avisa: sem corte
de gastos antes, nada de aumento de imposto. Faz sentido...
Com políticos, empresários,
estudantes, donas de casa, profissionais liberais e todo o resto tendo ataques
de perplexidade ou de cólera, só faltava cutucar a área militar com vara curta.
Como revelou a repórter Tânia Monteiro, não falta mais. Certamente guiado por
algum gênio do mal, o Ministério da Defesa fez publicar no Diário Oficial da
União uma portaria tirando poder dos comandantes do Exército, da Marinha e da
Aeronáutica sobre o pessoal militar para transferi-lo ao ministro Jaques
Wagner, do PT.
O, ou a, gênio do mal caprichou na
dose. A iniciativa é atribuída à secretária executiva da Defesa, casada com o
segundo homem do MST, o “exército do Stédile”. A publicação no DO foi três dias
antes da maior festa militar do ano, a parada de Sete de Setembro. E a
assinatura eletrônica foi do comandante da Marinha, na condição de ministro
interino, mas ele diz que nem sequer foi consultado. Um desastre.
É assim que Dilma vai se isolando
mais e mais, sem apoio popular e cercada por um PMDB guloso, um Lula assustado,
um Congresso hostil e o setor privado se desgarrando. E, além do desgaste da
imagem do Brasil no exterior, ainda cria encrenca desnecessária justamente com
as Forças Armadas.
Trancada no Planalto com Aloizio
Mercadante e Edinho Silva, a presidente parece sentada nos escombros da
economia, da política, da cúpula histórica do PT – e com a Lava Jato a mil por
hora. Sem querer cortar gastos e sem força política para aumentar a receita,
vai ter de fazer as duas coisas e pode até enxugar o Minha Casa, Minha Vida,
que é o que restou do maravilhoso mundo das campanhas e vem justificando as
viagens dela pelo País.
Goste-se ou não do deputado Eduardo
Cunha, é dele a definição perfeita e acabada do governo Dilma Rousseff: “É o
Maquiavel às avessas”. Maquiavel ensinava que o mal se faz de uma vez e o bem,
a conta-gotas. Dilma faz o mal a conta-gotas e o País continua aguardando para
saber qual o bem que ela é capaz de fazer. Inclusive, ou principalmente, a ela
própria.
Publicado no jornal O Estado de São Paulo