Pior dos mundos
Eliane Cantanhêde
Integrante do Conselho de Ética da Câmara, o deputado Zé
Geraldo (PT), foi, voltou, foi de novo, voltou de novo e ontem, horas antes da
decisão sobre abrir ou não o processo de cassação do presidente Eduardo Cunha,
soltou a seguinte pérola: “Se for emparedado, o Cunha solta o impeachment (da
presidente Dilma Rousseff) e, aí, é o pior dos mundos”.
Qual “pior dos mundos”, cara pálida? No mesmo dia, quase
na mesma hora, o IBGE anunciava “uma retração generalizada” da economia
brasileira, com queda entre julho e setembro de 1,7% em relação ao trimestre
anterior e de 4,5% diante do mesmo período de 2014.
Isso é resultado da “turbulência política” e mais: da
queda do nível de emprego, da redução da renda, da restrição ao crédito, dos
juros altos, da inflação assustadora. Assim, 825 mil brasileiros perderam suas
vagas em 12 meses, mais nove milhões estão desempregados e 20% dos jovens estão
fora do mercado de trabalho.
O consumo das famílias cai pelo terceiro trimestre consecutivo,
o investimento das empresas tem nove quedas consecutivas e o mais desanimador
da história é que, se ruim está, melhor não deve ficar. A previsão é de
recessão por dois anos consecutivos: mais de 3% negativos em 2015 e de 2% em
2016.
Sem falar na paralisia do governo depois dos cortes de
mais de R$ 11 bilhões para não desrespeitar – de novo – a Lei de
Responsabilidade Fiscal. E sem falar no constrangimento, inclusive
internacional, de faltar dinheiro até para bancar as urnas eletrônicas das eleições
municipais de 2016. Se tudo isso não é o “pior dos mundos”, o que será então?
O fato é que os três integrantes petistas do Conselho de
Ética – os outros dois são Valmir Prascidelli (SP) e Leo de Brito (AC) – também
ficaram no pior dos mundos, ensanduichados entre a pressão do Palácio do
Planalto, a cobrança das suas bases e o peso de suas próprias consciências.
Ninguém gostaria de estar na pele deles, principalmente
porque o PT está contra o Planalto, todo dividido, ou cada vez mais dividido. O
presidente Rui Falcão vai para um lado e o Planalto para outro; vai para um
lado e a bancada do Senado para outro; vai para um lado, o Ministério da
Fazenda de Dilma para outro.
Ontem, Rui Falcão escreveu (tardiamente) nas redes
sociais que os petistas do Conselho de Ética deveriam votar pela
admissibilidade do processo contra Cunha, quando as torcidas do Corinthians e
do Flamengo sabem que o Planalto e o próprio Lula articularam com o próprio
Cunha e com os líderes no Congresso para evitar a cassação do deputado.
Ou seja, o Planalto e Lula cederam à chantagem de Cunha,
que pôs uma faca no pescoço de Dilma: ou o PT votava contra o processo de
cassação dele, ou ele abriria o processo de impeachment dela. Colou, mas parece
que os dois lados se esqueceram de avisar o adversário: Rui Falcão.
Ele já tinha soltado uma nota dando de ombros para a
desgraça do senador Delcídio do Amaral e negando “qualquer solidariedade” ao
líder do governo. Mas, Falcão escreveu uma coisa e os senadores do PT fizeram
outra: nove deles votaram pelo relaxamento da prisão de Delcídio.
Bem, sem contar que Lula defende o governo em público e
Dilma defende Joaquim Levy em público, enquanto Rui Falcão ou patrocina
diretamente ou, pelo menos, apadrinha por baixo dos panos a campanha do partido
e dos movimentos alinhados ao partido contra a política econômica. Se o Brasil
já está no pior dos mundos, o PT não está muito melhor.
Os de sempre. Não foi por solidariedade, mas sim em causa
própria que Renan Calheiros, presidente do Senado, e Jader Barbalho, ex-presidente,
foram os mais loquazes e enfáticos defensores do voto secreto para ratificar ou
não a prisão de Delcídio Amaral. De uma só canetada, a PGR pediu na segunda, e
o Supremo acatou na terça, a abertura de inquérito contra... os três.