Fazendo o diabo,
de novo
Eliane
Cantanhêde
A presidente Dilma Rousseff termina o
ano de 2015 como começou, arrogante, errática e metida numa crise monumental,
agora tentando escapar do impeachment sob um fogo cruzado: de um lado, a
sociedade e o setor produtivo exigindo responsabilidade e ajuste das contas
públicas; de outro, a pressão do PT para dobrar a aposta do primeiro mandato e
priorizar uma política econômica populista em detrimento do bom senso e do
desenvolvimento sustentável.
A mente e o coração de Dilma balançam
entre uma coisa (botar a casa em ordem) e outra (ceder à tentação de agradar
PT, CUT, MST e UNE). É aí que mora o perigo. Os sinais da presidente na reta final
deste ano já tão dramático são no sentido de que, para tentar salvar o pescoço
e a fidelidade dos movimentos alinhados ao PT, “faz-se o diabo”, como nas
eleições.
Com a saída de Joaquim Levy,
evaporou-se o último e pálido empenho de Dilma com os ajustes, a
responsabilidade fiscal, a possibilidade de o Brasil recuperar a credibilidade
externa e interna e se preparar para voltar a crescer em 2017.
Com a chegada de
Nelson Barbosa, aumentam as dúvidas sobre a capacidade de Dilma de fazer o que
é preciso para tirar o País da crise.
Barbosa é um, digamos,
“desenvolvimentista”, apegado à velha ideia – nunca admitida, mas praticada na
“nova matriz econômica” – de que um pouquinho de inflação não faz mal a
ninguém, desde que crie uma fugaz sensação de bem-estar em eleitores ou em
entrevistados das pesquisas de opinião. Antes, era o “tudo pelo social”. Agora,
é o “tudo pela popularidade periclitante de Dilma”.
Até um ato burocrático de ontem
reforça emblematicamente essa opção de Dilma: a sanção de uma lei do Congresso
que alterou de 50 para 10 anos o prazo desde a morte para a inclusão de
brasileiros no Livro dos Heróis da Pátria. A medida tem um único intuito: transformar Leonel Brizola em “Herói da
Pátria”.
A decisão, publicada no Diário
Oficial da União nos estertores de 2015, tem simbologia, porque relembra a
todos que Dilma foi do PDT e só o trocou pelo PT em 2001, às vésperas da
primeira eleição de Lula para a Presidência. E que ela mudou de partido, mas manteve
sua alma brizolista.
O que significa? O brizolismo foi
construído em cima de quatro pilares: o combate à ditadura militar, de fato
heroico; o caudilhismo; o velho “nacionalismo” que achava bacana fechar as
portas aos investimentos e avanços internacionais; e o “estatismo”, pelo qual
as canetadas do Estado seriam mais benéficas ao País do que a força e as
potencialidades da parceria do setor privado com a sociedade.
Dilma é isto: foi uma guerreira
contra a ditadura, tem uma alma mandona e é uma “nacionalista” às antigas e uma
estatizante capaz de desestruturar o setor elétrico e de segurar
artificialmente as tarifas públicas pela convicção de estar praticando o “bem”,
o “justo”, “o que é melhor para o povo”.
Dilma e Levy eram como água e vinho,
que nunca se misturam. Mas Dilma e Barbosa têm tudo a ver. E foi a aliança
ideológica e de princípios econômicos entre eles que deu no que deu em 2015.
Dilma pode querer dobrar a aposta, mas deve saber o quanto será perigoso, para
o País e para ela, trocar a estabilidade e o futuro por um efêmero apoio do PT
e de seus aliados. Eles nunca serão PDT, como Dilma nunca será PT.
Publicado no Estadão.com em 30/12/2015