Visão delirante*
O pronunciamento de defesa da presidente afastada Dilma
Rousseff serve para resumir a visão parcial que têm ela e companheiros do
processo de deterioração da economia e do quadro social do país, de que são
responsáveis.
Na visão de Dilma, a crise surge do nada em 2015, com a
consequente queda da arrecadação. Na sua versão dos fatos não existe o
estelionato eleitoral praticado por ela e aliados, na campanha de 2014, jogando
para debaixo do tapete a gravidade da situação fiscal e mantendo a inflação
artificialmente baixa, por meio do condenável represamento de tarifas.
Como esperado, Dilma recusa a acusação de que atropelou o
Congresso na edição de decretos de gastos,sem a aprovação do Legislativo, e
argumenta, como fez sua defesa durante todo o processo, que seu governo cumpriu
a meta estabelecida para 2015. Esquece-se, como sua defesa, que a meta teve de
ser alterada no final do ano. Ou seja, alterou-se o tamanho do gol para a bola
entrar, depois do jogo iniciado e prestes a acabar.
Dilma também não consegue se defender da acusação das
“pedaladas”, o artifício de transferir rombos do Tesouro para bancos oficiais,
ao não ressarci-los pelos subsídios distribuídos, uma operação mascarada de
crédito à União, vetada pela Lei de Responsabilidade Fiscal. Um ato, bem como
os créditos abertos sem aprovação do Congresso, considerado crime de
responsabilidade, punido por impeachment.
A presidente afastada desafia a prudência ao misturar
momentos históricos muito diversos, ao se comparar a Getúlio Vargas, a
Juscelino Kubitschek e a João Goulart. Mas vale tudo para insistir na farsa do
“golpe”. Também é insensata a tentativa da presidente afastada em comparar o
julgamento pelo qual passou na Justiça Militar, na ditadura, com o atual,
tramitando dentro de todas as normas estabelecidas em leis e na Constituição.
Dilma sequer enrubesceu ao insistir na farsa, mesmo na
presença do presidente do Supremo Tribunal Federal, Ricardo Lewandowski.
O pronunciamento da presidente afastada visa também a
reforçar uma “narrativa” pela qual, aprovado, o impeachment terá sido uma
conspiração das “elites” feita sob o “silêncio cúmplice da mídia”. Trata-se de
um delírio conveniente, para encobrir o desrespeito, comprovado de forma
sólida, da Constituição e da Lei de Responsabilidade.
Ora, tudo transcorre dentro do estado democrático de
direito, substituindo-se, pelo Congresso, e garantido todo o direito de defesa,
uma presidente que cometeu crimes de responsabilidade pelo seu vice, eleito em
chapa única pelos mesmo 54 milhões de votos. Simples assim.
Publicado no Portal G1 em 29/08/2016