Alerta geral!*
Jogar os políticos na primeira instância, com
superintendentes camaradas da PF, é risco
Eliane Cantanhêde
O discurso de posse do delegado Fernando Segovia na
Direção-Geral da Polícia Federal foi bem recebido, mas ele desperta dúvidas
sobre o destino da Lava Jato e joga o foco em duas questões entrelaçadas: o fim
do foro privilegiado para políticos e a substituição dos superintendentes da PF
nos Estados. Pelo sim, pelo não, convém ficar de olho.
O risco é o deputado ou senador investigado sair da
alçada do Supremo Tribunal Federal (STF) e o governador escapar do Superior
Tribunal de Justiça (STJ) para cair no colo de um juiz amigo e de um
superintendente da PF camarada.
A PF tem sete diretores. Um deles, o corregedor, tem
mandato e independe da troca do diretor-geral, mas Segovia trocou todos os
outros seis. Dois dos novos têm a simpatia do seu antecessor, Leandro Daiello,
e os demais foram escolhas diretas do próprio Segovia, até mesmo na área de
inteligência.
A dúvida maior é quanto aos superintendentes estaduais,
lembrando que Segovia, apadrinhado por políticos, não pela cúpula da
corporação, já foi superintendente no Maranhão dos Sarney. Se ele desanda a
nomear superintendentes indicados por políticos, especialmente por
investigados, a sinalização será clara: ele foi posto lá para “estancar a
sangria”, como prega o líder do governo no Senado, Romero Jucá, referindo-se à
Lava Jato.
Parte inferior do formulário
É justo dar um voto de confiança a Segovia, que é jovem,
tem boa ficha funcional, prometeu reforçar o time da PF no STF e fez um giro
pelos gabinetes da presidente do Supremo, Cármen Lucia, e da procuradora-geral,
Raquel Dodge, para mostrar a que veio. Só ficou estranho o encontro dele com o
presidente Michel Temer. O chefe do diretor-geral da PF é o ministro da
Justiça.
Mas é bom acompanhar a escolha dos superintendentes, em
especial do próprio Maranhão, onde os Sarney têm lá suas encrencas, e no Rio
Grande do Sul, onde se destaca o chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha, citado na
Lava Jato e um dos padrinhos de Segovia. Os novos superintendentes têm de ser
como a mulher de César: além de serem, eles têm de parecer honestos e profissionais.
Quanto ao foro privilegiado para 513 deputados federais e
81 senadores, há consenso de que é mesmo um privilégio, como o próprio nome já
diz. Daí uma forte pressão da opinião pública e da própria cúpula da Lava Jato
para rever isso. O curioso é que tanto investigadores quanto investigados
defendem o fim do foro. E por que quem desfruta do privilégio quer acabar com
ele? Pelo combate à corrupção, ou por que preferem ser investigados e julgados
nos seus Estados?
É por isso que, em vez do “fim” do foro privilegiado, é
melhor a sua “revisão”, com regras, limites e quem deve ou não ser alvo do STF
e STJ. Tarefa para especialistas do direito e da política.
É fato, e é óbvio, que a primeira instância é muito mais
célere do que o STF, soterrado por uma avalanche de processos e sem os meios
para os casos de colarinho-branco, altamente complexos. Mas nem todo o juiz de
primeira instância é um Sérgio Moro, de Curitiba, um Marcelo Bretas, do Rio, ou
um Vallisney de Souza, do DF.
Vamos pensar sobre as relações entre o governador, o
prefeito, o juiz, o superintendente da PF e o padre em capitais menores e em
cidades do interior. Será que não se conhecem? Não frequentam as mesmas festas
e restaurantes? Os filhos não são amigos? Aliás, não são padrinhos dos filhos
uns dos outros?
No Senado, muitos já foram governadores e prefeitos e são
pais de quem hoje ocupa essas posições. É melhor para um senador ser julgado no
STF ou por juízes das suas relações? Então, a Lava Jato está num momento
decisivo, com a nova procuradora-geral, o novo chefe da PF e o Supremo julgando
a questão do foro nesta semana. Alerta geral!
*Publicado no Portal Estadão em 21/11/2017
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