Janot venceu*
A obsessão da PGR contra Temer deu certo, mas
Janot tem
contas a acertar com a história
Eliane Cantanhêde
A enxurrada de revelações sobre Joesley Batista e o
desgaste da PGR deixaram um rastro de destruição para o próprio Joesley e
atingiram a imagem de Rodrigo Janot, mas nem por isso refletiram positivamente
no presidente Michel Temer, principal alvo do complô da JBS com a PGR, com
beneplácito do Supremo. O estrago feito em Temer está feito e é comprovado
pelos chocantes 3% de aprovação na rodada CNI-Ibope.
Assim como o acordo de delação de Joesley explodiu, mas
as provas sobreviveram firmes e fortes, a credibilidade da gestão Janot na PGR
balançou, mas suas flechadas contra Temer atingiram o alvo e o presidente não
consegue se recuperar. Não tira proveito algum, político ou pessoal, da debacle
dos inimigos. Implodem todos, denunciantes e denunciados, e o desfecho da nova
denúncia contra Temer é esperado, mas vai custar caro – inclusive ao País.
Já estava claro quem era Joesley Batista quando ele
gravou Temer no Jaburu e “se pirulitou” para Nova York a bordo de seu jato e do
acordo do século com a PGR de Janot, homologado rapidinho pelo ministro do STF
Edson Fachin. Agora, é o próprio Joesley quem se declara, em nova gravação
divulgada pela revista, como um criminoso – e de diversas organizações
criminosas.
Uma questão central das delações da JBS foi Janot e sua
equipe se recusarem a classificar Joesley como chefe de quadrilha. Por quê?
Porque, se classificassem, ele não poderia se beneficiar do acordo. Não só se
beneficiou por sair livre, leve, solto, como aproveitou para embolsar mais
alguns milhões na Bolsa e no mercado de câmbio.
Era óbvio, e está cada vez mais ululante, que Joesley
era, sim, o chefe de uma das mais poderosas organizações criminosas gestadas
neste País, algo que foi debatido nos quatro dias de julgamento do Supremo
sobre até que ponto delações são intocáveis como cláusulas pétreas da
Constituição. Não são, nem podem ser, como comprova a rebordosa Joesley e já
vinha ensinando a PF, onde a perplexidade com a PGR é enorme.
Como diz um velho procurador, ninguém considera Michel
Temer um santo, mas não cabe à PGR, ao STF ou à PF trabalhar com “a obsessão”
de derrubar quem quer que seja, muito menos o presidente da República. A
expectativa é de que a nova procuradora-geral, Raquel Dodge, seja dura no
combate à corrupção e na condução da própria Lava Jato, mas sem passionalidade
e flechas, só com leis e regras. Vamos rezar.
Uma das mais perigosas cascas de banana no seu caminho é
a investigação sobre os procuradores tragados pelo tsunami, a começar de
Marcelo Miller e Ângelo Goulart Vilela, preso por favorecimento à JBS. Ambos
foram revelados por, digamos, agentes externos, não pela própria PGR. E agora,
a PGR vai investigá-los?
Outro fator é que há tempos não damos bola para CPIs, mas
a que investiga esse imbróglio tem apoio da PF, está a mil por hora e já produz
efeitos, como a quebra dos sigilos de Miller. Podem surgir cobras e lagartos
daí, inclusive a resposta para uma dica nas gravações de Joesley com Ricardo
Saud: eles diziam que Miller seria só o primeiro da PGR no escritório de
advocacia no Rio que defendia a JBS, depois viriam outros – como o próprio
Janot, após a PGR.
A bem de Rodrigo Janot, a imagem que ele deixa na PF, na
Justiça, no próprio STF, é mais de um equivocado, um justiceiro estabanado, do
que qualquer outra coisa mais grave. E deixa uma lição: no furor de combater a
corrupção, não se podem eleger seus corruptos favoritos para tratar bem e os
corruptos dos outros para flechar mortalmente. Isso costuma ter efeito
bumerangue. Dito e feito. A função mais urgente de Dodge é botar a casa em
ordem, descartar bambus e flechas e reativar as leis e a imparcialidade.
*Publicado no Portal Estadão em 01/10/2017