O exemplo da Argentina*
O resultado das eleições legislativas da Argentina,
realizadas no domingo passado, é a prova de que um discurso firme e coerente em
favor da responsabilidade fiscal e das reformas é viável como bandeira política
e eleitoral. Trata-se de um bom exemplo para o Brasil, que até agora não tem,
entre os pré-candidatos a presidente, nenhum com coragem de assumir
integralmente essa agenda, tão necessária para a reconstrução do País depois da
devastação lulopetista. Ao contrário: o atual líder das pesquisas de intenção
de voto, Lula da Silva, prometeu reverter todas as principais reformas levadas
a cabo pelo presidente Michel Temer.
O grande vencedor na Argentina foi o grupo político do
presidente Mauricio Macri, cuja administração, cumprindo o que fora anunciado
em sua campanha, está levando adiante um programa de mudanças para ajustar a
economia, que, assim como aconteceu no Brasil, foi arruinada pela demagogia do
casal peronista Néstor e Cristina Kirchner.
É verdade que Macri vinha implementando seu programa a
conta-gotas, já que julgava não contar com suficiente apoio político para
acelerar o processo. No horizonte do governo estava a memória de uma série de
presidentes que se afastaram do peronismo, nenhum dos quais conseguiu terminar
o mandato.
Mesmo assim, Macri entendeu que era urgente reduzir os
imensos subsídios concedidos pelo governo de Cristina nas tarifas de energia
elétrica, água e transportes, pois essas bondades clientelistas estavam
ajudando a quebrar o Estado. O resultado imediato foi uma deterioração dos
salários, uma forte alta dos preços e um aumento do desemprego. Aos poucos,
porém, os efeitos das medidas de Macri – que incluíram a abertura do país a
investidores estrangeiros, o fim do controle cambial, depois de quatro anos de
tentativas desesperadas de conter a fuga de divisas, e a renegociação com
credores externos para restabelecer a confiança internacional no país –
começaram a se fazer sentir. A inflação, ainda na casa dos 20%, recuou e a
economia aponta uma expansão de 3%. A tese da necessidade das reformas, ainda
que tímidas, ganhou mais força eleitoral.
No domingo, o eleitor argentino tornou a chancelar a
intenção de deixar para trás os anos de aventura kirchnerista. A coligação do
presidente Macri venceu em 13 das 24 províncias e de quebra seu candidato ao
Senado pela Província de Buenos Aires foi o mais votado, deixando em um amargo
segundo lugar a também eleita Cristina Kirchner. Assim, a base de Macri passou
de 86 para 107 cadeiras na Câmara, enquanto no Senado o presidente terá o apoio
de mais 9 senadores, num total de 24. Nenhum desses blocos lhe garante maioria,
mas está claro que Macri dispõe de sustentação popular para continuar as
reformas, ainda que seja necessário manter o gradualismo.
“A Argentina não pode ter medo das reformas”, discursou
Macri quando os resultados foram anunciados. Para o presidente, cuja
candidatura à reeleição em 2019 ganha força desde já, especialmente diante da
fragmentação do peronismo, “esse é um caminho longo que nos levará a uma
sociedade mais justa, a um país que se baseará na cultura do trabalho e de
mérito de cada argentino”.
Já no Brasil, não há postulantes à Presidência da
República com discurso semelhante, embora seja claro, a esta altura, que sem
reformas profundas o País, a despeito de seu enorme potencial, estará condenado
à segunda divisão do desenvolvimento global. Quase todos os possíveis
candidatos omitiram-se em relação aos esforços do governo de Michel Temer para
aprovar o ajuste fiscal e as reformas, quando não os sabotaram. É o caso, por exemplo,
do ex-presidente Lula, que avisou, em entrevista ao jornal espanhol El
Mundo, que pretende convocar “um referendo revogatório de muitas das medidas
aprovadas por Temer” e chamou de “criminoso” o teto estabelecido para os gastos
públicos.
A atual experiência argentina mostra que é possível
vencer uma eleição defendendo o oposto do que pregam Lula e outros demagogos.
Basta dar uma chance ao eleitor cansado de tanta irresponsabilidade.
*Publicado no Portal Estadão em 25/10/2017