Decisão inevitável*
A intervenção federal na Segurança fluminense foi forçada
pelo quadro criado a partir da crise financeira do estado, com a perda de
comando sobre as polícias e o esvaziamento do poder do governador Luiz Fernando
Pezão, também atingido por estilhaços da explosão do seu grupo político,
envolvido em corrupção, parte dele encarcerado, a começar pelo chefe, Sérgio
Cabral.
As ocorrências no carnaval foram o ápice neste processo,
e era mesmo imperioso decretar a intervenção na área de segurança do estado,
historicamente problemática, com infiltrações visíveis do crime organizado. O
caso do batalhão da PM de São Gonçalo, vizinho a Niterói, associado a
traficantes da área, é emblemático. PMs chegavam a trabalhar em bocas de fumo.
Neste sentido, portanto, a crise financeira veio apenas
agravar o que já acontecia. O aprofundamento da degradação do aparelho de
segurança ao menos dá a chance de, com esta intervenção, ser preparado o
terreno para a regeneração do aparato policial.
O ministro da Defesa, Raul Jungmann, tivera conversas
reservadas no âmbito estadual sobre uma "intervenção branca" na
Secretaria de Segurança. Uma forma de o Executivo federal assumir a área, sem a
necessidade de, como estabelece a Constituição, suspender-se a tramitação no
Congresso da reforma da Previdência. Mas o governador Pezão precisaria pedir
esta ajuda.
Não o fez e só agora aquiesceu, e a uma intervenção
formal, diante do avanço do crime, com tiroteios constantes em comunidades e
fora delas, fazendo vítimas inocentes, várias crianças entre elas.
A situação de descontrole observada nas ruas terminou
deixando em segundo plano a questão da reforma previdenciária, embora ela possa
ser votada, numa suspensão momentânea do decreto de intervenção apenas para
isso, como mencionou o próprio presidente Temer no pronunciamento que fez na
solenidade de assinatura do decreto.
O comandante militar do Leste, general Braga Netto,
conduzirá a intervenção, a primeira realizada sob a Constituição de 88, com a
vantagem de já ter atuado em ações articuladas no Rio, de curto prazo,
destacando-se o trabalho de segurança na Olimpíada. Conduziu, também, uma
operação semelhante no Espírito Santo. Com os poderes de interventor, o general
Braga Netto terá oportunidade de remover gargalos que impedem uma efetiva
coordenação entre as Forças Armadas e as polícias fluminenses. Em ações tópicas
anteriores, houve até sabotagem na área de informações, para desacreditar as
forças federais.
Não há uma solução instantânea para a crise de segurança
no Rio, parte de um problema que é nacional. Portanto, a intervenção em si é
apenas um meio para conter e reverter a debacle. Serão necessárias ações
efetivas na cidade, no estado e nas fronteiras, numa intensidade ainda não
vista. A intervenção irá até 31 de dezembro. Talvez seja pouco.
*Publicado no Portal O Globo em 16/02/2018
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